Há uma pergunta que precisamos fazer com coragem: a quem serve a proposta de Armínio Fraga de congelar o salário mínimo por seis anos? A resposta é clara — e desconcertante. Ela não serve ao Brasil. Serve ao mesmo grupo político que historicamente combate os avanços sociais promovidos por governos progressistas: a Direita e a Extrema-Direita que hoje dividem palanques, manchetes e interesses.
Fraga, ex-presidente do Banco Central e atual gestor de uma das maiores casas de investimentos do país, ressurge com um discurso embalado em tecnocracia, mas recheado de ideologia — a mesma ideologia que naturaliza a desigualdade, culpabiliza os mais pobres e santifica o capital.
“É sempre no lombo do trabalhador que a elite quer aplicar a tesoura”, repito sem medo, porque sei que essa narrativa já foi testada antes — e falhou.
Quando Fraga propõe congelar o salário mínimo como solução para o Brasil, ele não está apenas fazendo uma aposta econômica. Está oferecendo um caminho político. Um caminho que atrai justamente aqueles que querem silenciar a esquerda, barrar o debate sobre justiça social e desmobilizar a população que mais sofre com a desigualdade. É o velho receituário que diz: se os ricos estão incomodados, é porque os pobres estão ganhando demais.
E vamos aos dados: segundo levantamento da Bloomberg, o Brasil ocupa a 13ª posição entre os países da América Latina em valor de salário mínimo convertido para o dólar. São 244 dólares mensais, muito abaixo de Costa Rica, Uruguai e Chile. E ainda assim, Armínio Fraga acha que o problema do Brasil é o salário do pobre. Não são os juros, nem os subsídios bilionários, nem as isenções fiscais dadas a grandes grupos — é o reajuste do salário mínimo que incomoda.
“A proposta de Fraga não é técnica. É política. E pior: é uma política a serviço de quem quer manter os privilégios de sempre”. E nesse ponto, é impossível não perceber como essa fala encontra respaldo em setores da Direita e Extrema-Direita que, mesmo travestidos de liberais ou conservadores, só têm uma causa em comum: manter o povo fora do orçamento e fora das decisões.
Não à toa, a proposta não toca na estrutura perversa dos juros, não debate o sistema regressivo de impostos, não sugere cortes nas mordomias estatais nem nos lucros dos bancos. Tudo é resolvido com austeridade seletiva.
“É o arrocho como redenção, a pobreza como destino, e o silêncio como regra” — e esse é exatamente o Brasil que esses grupos querem consolidar.
Mas o salário mínimo não é apenas uma cifra: é base de cálculo para aposentadorias, abonos, BPC e programas sociais. Ao congelá-lo, você congela a vida de milhões de brasileiros. Você não estanca um problema fiscal — você aprofunda uma tragédia social.
A professora Simone Deos, da Unicamp, disse com precisão:
“Não há nenhum estudo que sustente a tese de que o Brasil esteja em colapso fiscal. Mas há um histórico de discursos como o de Armínio Fraga, que prevêem o caos há décadas — e o caos nunca chega.”
O que chega, na verdade, é o lucro fácil, a concentração de renda e o empobrecimento programado da base da sociedade. O Brasil não está na UTI. Mas querem colocá-lo lá. E quem não se posiciona contra isso está, ainda que veladamente, a favor.
“A esquerda tem sido a única trincheira de resistência contra esse projeto excludente”, e não por romantismo, mas por compromisso com um Brasil real, onde a maioria ainda luta para comer três vezes ao dia. É essa esquerda que incomoda os Fragas da vida. É por isso que tentam desmoralizá-la, criminalizá-la, silenciá-la.
Só que a história tem memória. E ela já mostrou que congelar salários não resolve nada. Que chamar o povo de problema é a forma mais covarde de preservar os privilégios de poucos. E que nenhum país se levanta pisando sobre os ombros dos que mais precisam.
Sobre o autor: Luiz Cláudio Cavalcante é servidor público, especialista em comunicação em redes sociais e assessor parlamentar. Jornalista e produtor audiovisual, ele também é membro da executiva do Sindicato dos Jornalistas de Goiás, onde atua na defesa dos direitos da categoria e na promoção de uma comunicação de qualidade.
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